As poderosas do mercado de HQs
Sâmela Hidalgo fala sobre Karen Berger e Sana Almanat, mulheres que transformaram o mercado internacional de quadrinhos
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Sâmela Hidalgo fala sobre Karen Berger e Sana Almanat, mulheres que transformaram o mercado internacional de quadrinhos
Os quadrinhos mudaram a vida delas…. e a minha.
Vocês devem estar se perguntando porque eu os reuni aqui hoje. Bem, pra começar, queria fazer um paralelo da minha própria vida com o texto que decidi escrever aqui, então, vamos lá!
Sempre fui apaixonada pelo ato de ler. Os livros fizeram parte da minha vida desde muito novinha, então podemos dizer que sempre fui uma leitora nata. Quando cresci e decidi fazer da minha paixão uma profissão, não passou pela minha cabeça ir pelo rumo dos quadrinhos e, sim, da literatura. Essa descoberta profissional veio quando eu já estava na faculdade e os quadrinhos entraram avassaladoramente na minha vida. Foi uma explosão de novidades que fez com que minha alma se encontrasse e meu propósito de vida fosse firmado.
Então, resumindo, sou uma pessoa que veio de outra área e migrou para os quadrinhos já na vida adulta. E, pensando sobre isso, percebi que – mais uma vez – outras mulheres na indústria também fizeram essa migração e mudaram de vida. Mas, depois de ler esse texto, talvez você perceba que além de mudar a vida delas próprias, elas mudaram a vida de muitos leitores e de toda a indústria de quadrinhos… para sempre!
Preparem seus gibis para conhecer ou saber mais sobre duas poderosas do mercado internacional.
Todos conhecem a DC Comics como uma das maiores editoras do mundo. Mas, lá nos anos 80, a DC teve os títulos mais bem sucedidos dos quadrinhos na época e esse sucesso tem nome e sobrenome: Karen Berger.
Karen nunca foi uma pessoa interessada em quadrinhos – muito menos em super-heróis. Formada em Literatura Inglesa e História da Arte, ela só queria um trabalho fixo no Museu ou em revistas de Arte. Mas tudo mudou quando ela encontrou seu velho amigo J.M. DeMatteis, que trabalhava na DC, e ele lhe ofereceu um emprego lá. Esse foi o empurrãozinho que Berger precisava pra abrilhantar aquela empresa.
Ela passou a ser responsável pelas histórias do Batman, também pelas revistas de terror House of Mystery e House of Secrets. O boom da sua carreira na DC se deu quando ela – majestosamente – decidiu contratar um roteirista inglês até então um pouco desconhecido nessa época. O nome dele? Alan Moore! Moore trabalhou no título Monstro do Pântano fazendo uma repaginação total no personagem e tornando o título mais lucrativo daquele ano. Berger, Berger… uma visionária.
Além disso, ela também foi a pessoa que coordenou o quadrinista George Perez nos famosos títulos de Mulher-Maravilha, que foi um sucesso e deu uma nova perspectiva na história da maior heroína de todos os tempos. Aí você pensa: Bom, ela realmente mudou tudo né? Acabou por aí.
Na-na-ni-na-não! Ela não estava satisfeita (pra nossa alegria) e comandou a famosa “Invasão Inglesa” nos quadrinhos quando chamou o queridinho autor Neil Gaiman para encabeçar o projeto Sandman… Bom, nem preciso falar que foi um sucesso estrondoso que fez com que levasse Berger a estar no panteão dos maiores editores de quadrinhos do mundo.
Esse sucesso todo resultou em um convite para liderar o novo selo da DC chamado Vertigo, onde por 20 anos ela comandou e editou as séries principais: Sandman, Hellblazer, Monstro do Pântano e Doom Patrol.
Com toda essa bagagem e conhecimento adquirido, em 2017 Karen resolveu abrir sua própria editora: Berger Books e continua reinventando o mercado de quadrinhos mundial com suas obras.
Uma mulher à frente do seu tempo, sem dúvidas, e que fez a carreira de muito marmanjo que é ídolo dos leitores de quadrinhos no mundo todo hoje. Sem ela, meus queridos, nada disso teria acontecido.
Bem, deixa eu vestir minha camiseta de Marvete agora pra falar daquela que entrou no jogo pra mudar todo o background e passou a ser conhecida como a mulher mais poderosa da Marvel.
Sana Almanat, uma americana-paquistanesa, filha de imigrantes, muçulmana que nasceu em Nova Jersey – parece um roteiro conhecido, né? Já já eu chego nessa parte. Formada em Ciência Política com foco no Oriente Médio, também não era uma fã de quadrinhos. Mas, sua experiência em política social visando a diversidade chamou a atenção do grande editor da Marvel, Joe Quesada.
Então, em 2009, Sana foi contratada pela Marvel para uma tarefa beeeem complicada: levar representatividade para os heróis que refletissem a diversidade do público leitor atual. Que responsabilidade, hein?
Mas ela conseguiu levar isso a frente com maestria e botou a mão na massa pra criar personagens e reinventar histórias. Podemos dizer até que existem dois momentos na história da Marvel: Antes de Sana x Depois de Sana, porque ela realmente dividiu a era no meio e deu um novo rumo para o mercado.
Almanat trabalhou na repaginação da personagem Carol Danvers – nossa querida Capitã Marvel. Começando em dar um uniforme apropriado para a Capitã: algo militar que refletisse sua carreira e sua importância. E, claro, deixando de lado aquele maiô ridículo e desconfortável que nada agregava à heroína. Contratou a roteirista Kelly Sue Deconnick para dar uma nova vida à Carol e, 2012, junto com o ilustrador Dexter Soy, reformulou toda a história da personagem, fazendo com que mais leitoras se juntassem ao meio nerd e aproximando esse público. Não à toa o filme da Capitã Marvel de 2018 foi baseado nessa fase, faturando mais de 1 bilhão em bilheteria e fazendo com que muito nerd fosse dormir chorando.
Mas foi em 2014 que todos passaram a realmente conhecer seu nome e seu trabalho. Numa conversa com o editor-chefe, Sana contou sobre sua infância e sobre sua origem paquistanesa e como foi crescer sendo muçulmana nos Estados Unidos. Surgia nesse momento a heroína mais popular e rentável da atualidade: Kamala Khan, a nova Ms Marvel. E surgia também uma grande fã dessa personagem: eu mesma.
Sana decidiu contratar a escritora mulçumana e especialista em literatura árabe G Willow Wilson. Juntas, elas criaram toda a história e concepção da personagem transformando Kamala na nova queridinha do mercado e dos leitores. As edições da nova Ms Marvel quebraram recordes de venda, faturaram prêmios e ficaram semanas nas listas dos mais vendidos. Rendeu jogos, animações, colecionáveis e uma série live action pela Disney Plus (que está em produção no momento). E a melhor parte: criou leitoras, cativando-as com a história da adolescente desajeitada, que joga World of Warcraft e escreve fanfics: nada mais que uma heroína que muitas meninas e mulheres do mundo inteiro puderam, finalmente, se reconhecer e se identificar.
Ela também introduziu heroínas como Jane Foster como Thor, Riri Williams como Coração de Ferro e muitas outras, assumindo o comprometimento de representação e representatividade na frente e atrás das páginas.
Hoje, Sana é a vice-presidente de conteúdos criativos e desenvolvimento de personagens da empresa e seu trabalho abrange todo o universo Marvel e ela ainda foi responsável por introduzir muitas mulheres no mercado de quadrinhos, tanto as personagens, quanto as autoras e ilustradoras.
O impacto que Sana Almant teve na indústria ainda vai ressoar durante muito tempo. É por ela que estou aqui, hoje, amando, respirando e vivendo de quadrinhos.
Eu juro: quero ser essas mulheres quando eu crescer.
Sâmela Hidalgo é manauara, assistente de edição de quadrinhos e assessora de imprensa da Editora Devir Brasil, podcaster no DFP e idealizadora do projeto Norte em Quadrinhos, que visa dar visibilidade para quadrinistas do Norte do país.
Siga: @samelahidalgo e @norteemquadrinhos
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