Caros jornalistas de quadrinhos
Dani Marino oferece dicas para jornalistas que desejam entrevistar e incluir autoras de HQs em eventos sem cair em estereótipos e preconceitos
Quer receber novidades sobre histórias em quadrinhos? Inscreva-se!
Quer receber novidades sobre histórias em quadrinhos? Inscreva-se!
Quer receber novidades sobre histórias em quadrinhos? Inscreva-se!
Dani Marino oferece dicas para jornalistas que desejam entrevistar e incluir autoras de HQs em eventos sem cair em estereótipos e preconceitos
Frequentemente participo de entrevistas ou eventos onde o entrevistador/mediador me convidou por indicação de alguém, ou seja, um profissional do meio dos quadrinhos que não tem noção de quem eu seja e nem sobre tudo que já produzi. Até aí, tudo bem, afinal, minha área é a pesquisa acadêmica e ninguém tem a obrigação de saber de tudo.
O pouco que sei sobre jornalismo, indica que se eu vou entrevistar alguém de quem nunca ouvi falar, como já ocorreu diversas vezes em que fui mediadora em eventos, eu devo me inteirar sobre o que meu convidado faz para não ficar rodando em círculos com perguntas senso comum que entregam minha falta de conhecimento ou de interesse (o que é pior) sobre um determinado assunto.
No entanto, entra ano e sai ano, chega o mês de fevereiro e os sites e espaços especializados em quadrinhos começam a procurar mulheres para cumprirem a cota do mês da mulher. Aí, é um verdadeiro show de horror, porque quando achamos que finalmente poderemos falar sobre nossa produção, chegam perguntas do tipo: “COMO É SER MULHER NO MEIO DOS QUADRINHOS?” ZZZzzzzzzz
(É ser lembrada todo mês de março para responder a essa mesma pergunta feita por homens que não leem e não consomem nosso trabalho e acham que estão fazendo um grande favor em nos chamar, sendo que, além de produtoras, somos também consumidoras de HQ)
“VOCÊ SOFREU ALGUM PRECONCEITO POR SER MULHER NOS QUADRINHOS?”
(Sim. E essa pergunta é um exemplo disso.)
“COMO VOCÊ VÊ A PRODUÇÃO FEMININA DE QUADRINHOS NA ATUALIDADE?”
(Com os olhos que enxergam que homens continuam resumindo a nossa produção a “assuntos femininos”)
Arte de Bennê Oliveira – @leve.mente.insana
Recentemente, participei de uma entrevista em que todas as perguntas se restringiam ao fato de eu ser uma mulher. Ai, fiquei imaginando se o rapaz havia feito as mesmas perguntas ao quadrinista veterano que havia entrevistado antes de mim: Como é ser homem nos quadrinhos? Como você vê a produção dos seus brothers? Sofreu algum preconceito por ser homem?
Nesse sentido, não há como não enaltecer os eventos realizados pelo antigo coletivo Lady’s Comics, onde as mesas não giravam em torno do fato de sermos mulheres, mas em torno da nossa produção: quadrinhos de terror, jornalismo em quadrinhos, construção de personagens, roteiro… Por isso, vou deixar aqui um trecho de um texto que escrevi há alguns anos em parceria com a Samantha Coan, do Lady’s Comics, no intuito de fazer com que alguns jornalistas, se chegarem a ler o que escrevemos, percebam que insistir em certas perguntas é um atestado de falta de interesse nas produções que não tenham homens como centro das narrativas. O mínimo que se deve fazer antes de um evento ou entrevista, caso não vá consumir o que sua convidada faz, é ler as entrevistas e resenhas sobre seu trabalho aqui no Mina de HQ e em outros sites especializados, como Delirium Nerd, Garotas Geeks, Lady’s Comics, entre outros.
Claro que essas são apenas algumas dicas que não devem solucionar todos os problemas em relação à forma como as quadrinistas são frequentemente abordadas, mas a mensagem mais importante é: não faça com que uma mesa ou entrevista gire em torno do fato de sua convidada ser uma mulher. A conversa deve girar em torno dos mesmos tópicos que giram quando há convidados homens, ou seja, de suas produções, interesses, projetos.
Não deixe de espalhar a mensagem porque março tá logo ali.
Dani Marino é Mestra em Comunicação pela ECA/USP e pesquisadora de Quadrinhos e cultura pop especializada em questões de gênero. Integrante da Associação de pesquisadores em Arte Sequencial, a ASPAS, publicou diversos artigos e capítulos de livros no Brasil e no exterior, e é também uma das organizadoras do livro Mulheres e Quadrinhos, vencedor em duas categorias no troféu HQMIX 2020.
A arte que ilustra esse texto é de Helô D’Angelo: @helodangeloarte
Quer receber HQs inéditas em primeira mão?
Clique aqui e apoie a Mina de HQ!
Dani Marino é especialista em histórias em quadrinhos e questões de gênero. Mestre em Comunicação e doutoranda em Ciência da Informação pela ECA/USP, também atua como professora de Literatura Inglesa. Ganhadora de 2 troféus HQMIX com o livro Mulheres e Quadrinhos, que organizou com Laluña Machado, já colaborou com diversos sites e canais especializados em cultura pop.