Que nossas vozes sejam ouvidas
Por meio de suas histórias em quadrinhos, Bennê Oliveira, do Recife, e Triscila Oliveira, do Rio de Janeiro, mostram realidade das trabalhadoras domésticas no Brasil
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Por meio de suas histórias em quadrinhos, Bennê Oliveira, do Recife, e Triscila Oliveira, do Rio de Janeiro, mostram realidade das trabalhadoras domésticas no Brasil
Duas novas produções nos quadrinhos se somam às outras linguagens artísticas que estão ajudando a romper com o imaginário sobre vida das trabalhadoras domésticas.
A experiência de vida, especificamente de diaristas, tem oferecido aos leitores das HQs Os Santos e A Confinada, escritos por Triscila Oliveira e Leandro Assis, novos olhares sobre as relações de trabalho e de opressões no país. “Essa é a importância do que a gente faz, literalmente foi necessário desenhar para que muita gente começasse a compreender o que sempre esteve na cara de todo mundo”, enfatiza a Triscila. Os quadrinhos ganharam atenção pelo discurso direto sobre os privilégios. Antes eram escritos e desenhados apenas por Leandro, que na décima edição passou a ser acompanhado de Triscila, ex-faxineira e hoje cyberativista feminista, de Niterói, Rio de Janeiro. “Minha chegada aos quadrinhos foi pelo convite do Leandro, que se mostrou aberto à escuta, que é o que a gente tanto pede às pessoas. Escuta. Que nossas vozes sejam ouvidas. Então, contei minha história, a história da minha família. Muitas das experiências de Os Santos são minhas e das minhas parentes”, explica.
Já Bennê Oliveira, artista de Recife, Pernambuco, é filha de Janaína, trabalhadora doméstica, e se inspira nas histórias que escuta dentro de casa para produzir as tirinhas Leve Mente Insana. “Acho a história da minha mãe muito interessante: de ser essa mulher recifense que saiu da escola antes de completar o ensino médio, tem onze irmãos, perdeu o pai muito cedo, não foi exatamente criada pela mãe, mas pela família do meu avô. Ela e cinco irmãs são todas domésticas, com exceção de uma que foi, mas depois passou a ser manicure. Minha família toda é formada por trabalhadoras domésticas. Todas tinham as mesmas histórias e as festas de família é onde a gente conversa sobre tudo, inclusive sobre as profissões de cada uma e as dificuldades no trabalho”, conta.
A mãe foi a incentivadora de Bennê para desenhar desde pequena, ainda que ela tenha optado pelo curso de biologia na graduação. “Ela me ensinou os primeiros rabiscos.” Algumas de suas tiras são sobre a vida da mãe, que além de servir de inspiração passou a ser companheira em mesas de vendas em eventos de quadrinhos. “Faço tirinhas sobre ela ser empregada doméstica e como certas coisas me incomodam”. As tiras denunciam discursos como “você também é parte da família”, acúmulo de funções, baixa remuneração e o contexto da pandemia para as profissionais. Bennê nos mostra uma realidade não estereotipada e nos coloca em contato com uma perspectiva nova: o lugar de filha da trabalhadora. O processo criativo da artista é pautado pela “crítica do momento”, sem toda a profundidade que gostaria de transmitir sobre o trabalho doméstico remunerado da mãe. As dinâmicas familiares são inspiração quando fala de afeto e como a matriarca é um suporte das reflexões diárias.
Essas histórias em quadrinhos chegam a nós, leitores, para nos mostrar o que não estamos ouvindo sobre as lutas dessas mulheres no Brasil.
Triscila Oliveira é escritora do Rio de Janeiro (RJ), coautora dos quadrinhos “Os Santos” e “Confinada”. É ciberativista antirracista, feminista e produz conteúdo político no perfil @afemme1. Siga também: @soulanja
Bennê Oliveira é de Recife (PE). Autora das tirinhas “Leve Mente Insana” e da HQ Mares, ela desenha desde que se conhece por gente, estimulada sempre por sua mãe. Começou a produzir quadrinhos ao sentir que apenas falar sobre o que sentia não era o suficiente. Tenta humildemente viver de arte e produz tirinhas semanalmente para o Instagram. Siga: @leve.mente.insana
Samanta Coan é leitora de quadrinhos e feminista. Foi co-fundadora do coletivo Lady’s Comics, uma das iniciativas mais importantes que já aconteceram no Brasil sobre histórias em quadrinhos feitas por mulheres. Saiba mais sobre Samanta aqui.
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