As Jornadas Internacionais de HQs
Saiba o que rolou nas últimas Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos da USP, que aconteceram na ECA em Agosto
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Saiba o que rolou nas últimas Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos da USP, que aconteceram na ECA em Agosto
Para quem acompanha a Mina de HQ, nosso interesse pela pesquisa sobre quadrinhos não é uma novidade, principalmente quando as pesquisas são voltadas para o registro da produção feminina e LGBT. Eu mesma conheci a Gabi Borges em uma das edições da Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos da USP, que ocorriam desde 2011 a cada dois anos, mas desde 2017 passaram a ser anuais. Na época a Gabi falava sobre sua pesquisa de mestrado realizada sobre a produção de quadrinhos femininos na Argentina, onde cursou a pós-graduação.
Eu fui em quase todas as edições do evento desde 2013 e desde então, acompanho com muita curiosidade as comunicações e produções dos colegas, sempre observando as tendências de temas e bibliografias. Por exemplo, quando comecei a pesquisar e a frequentar esses eventos, notei que havia uma recorrência bem grande de autores como McCloud e Eisner para justificar a utilização de quadrinhos em diversas áreas. Essa é uma prática comum para quem está começando a estudar quadrinhos academicamente, no entanto, é notável o amadurecimento desses estudos que pode ser notado através dos temas e bibliografias mais recentes utilizadas. (Para saber mais sobre o assunto, nesse texto eu falo um pouco da pesquisa acadêmica e divulgação científica)
E em decorrência da pandemia, não só muitos programas de pós-graduação perderam verbas que possibilitavam que os pesquisadores de vários estados frequentassem as jornadas, como também não havia a possibilidade de eventos presenciais por 2 anos. Por isso, em 2021 e 2022 a jornadas ocorreram exclusivamente de forma remota. Mas com o retorno às atividades presenciais, a edição de 2023 ocorreu de forma híbrida entre os dias 22 e 25 de agosto: há comunicações que foram apresentadas apenas de forma remota e outras que foram presenciais, mas com apresentação de vídeo também. A programação pode ser conferida aqui e os vídeos podem ser assistidos no canal do Observatório de Quadrinhos da USP no Youtube. No site das jornadas também é possível ter acesso aos resumos e artigos das edições anteriores de acordo com o tema de seu interesse.
Nesse ano, de todas as comunicações e palestras que assisti, algumas me chamaram a atenção por motivos distintos. Na abertura do evento tivemos uma palestra sobre como o Japão usa ativamente a cultura pop em sua política externa para conquistar a simpatia de outros países e assim, garantir bons acordos comerciais (disponível em breve). Ao falar sobre soft power, a Vice-consulesa do Japão, Akiko Kikuchi, explicou que a utilização de mangás e animes, além da promoção de concursos de cosplays em vários países, são estratégias firmadas oficialmente pelo ministério de relações internacionais do país. Já as pesquisadoras Lettícia Gabriela e Karoline Caetano, que já aliciei para falarem sobre suas pesquisas aqui na Mina, trouxeram dados interessantes sobre questões bem pertinentes relacionadas a gênero e etnia. Enquanto Lettícia analisa o tropo da mulher poderosa e louca no arco da Feiticeira Escarlate em WandaVision e outras produções, Karoline faz um levantamento sobre a relação entre financiamento coletivo, editais de fomento cultural e a produção de quadrinhos com temáticas indígenas.
Waldomiro Vergueiro, Sonia Luyten e Akiko Kikuchi
No segundo dia, a palestra sobre charges e metodologia de análise apresentada pelo professor e historiador Rozinaldo Antonio Miani, embora bem útil, incorre na velha prática de ignorar que mulheres também produziram e produzem charges no Brasil. Não mencionar Ciça Pinto, Pagu, Hilde Weber ou Mariza Dias é uma falha imperdoável em 2023. Não à toa, fui logo comentar com o pesquisador que em suas próximas análises não deixe de conferir o trabalho do Políticas HQ e que não ignore artistas como Carol Andrade, Triscila Oliveira, Marília Marz, Lana Flowerz, Tai…
Por fim, a pesquisadora Victoria Saibene nos contou sobre a produção de quadrinhos em seu país, o Uruguai. Por ser um país bem menor e com uma história bem diferente da nossa, a produção de HQs por lá começou bem depois da nossa. Que eu me lembre, nenhuma mulher foi mencionada, o que não é exatamente uma surpresa, uma vez que a produção atual no país lembra bastante o que tínhamos por aqui nos anos 1980, ou seja, há esperança de que com o edital de fomento cultural que o país promove em âmbito federal atraia mais mulheres para esse tipo de produção.
Livros distribuídos aos participantes nas 7as jornadas
Embora eu não tenha feito um levantamento sobre a participação das mulheres ao longo das edições das jornadas, é nítido que essa participação só aumenta a cada ano e nós temos sido as principais responsáveis pelo registro e divulgação de quadrinhos produzidos por outras mulheres, já que grande parte dos homens cis seguem falando sobre super-heróis, sobre si mesmos e suas produções e sobre quadrinhos autobiográficos ou independentes produzidos por… homens cis, obviamente. No entanto, a Nara Bretas (que sempre menciono porque é uma das minhas referências na tese do doutorado e é colunista aqui na Mina), teve a excelente ideia de mapear todas as comunicações das jornadas que analisam obras de quadrinistas brasileiras desde 2011 (pág. 286-288) até 2019 e é palpável como tem crescido o número de mulheres pesquisando mulheres.
Então, se você tem interesse em se juntar a nós nessa empreitada, saiba que material para fundamentação e justificativa da sua pesquisa não falta. E sobre minha comunicação nesse ano, falei sobre linguagem queer como possibilidade de ferramenta de análise de quadrinhos LGBTQIAP+. Bora pesquisar?
Euzinha apresentando minha comunicação
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Daniela Marino é pesquisadora de quadrinhos e questões de gênero, graduada em letras, mestre em comunicação e doutoranda em ciência da informação.
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Dani Marino é especialista em histórias em quadrinhos e questões de gênero. Mestre em Comunicação e doutoranda em Ciência da Informação pela ECA/USP, também atua como professora de Literatura Inglesa. Ganhadora de 2 troféus HQMIX com o livro Mulheres e Quadrinhos, que organizou com Laluña Machado, já colaborou com diversos sites e canais especializados em cultura pop.