As mulheres no Festival Angoulême
Momento histórico: Grand Prix do Festival Angoulême de Quadrinhos foi disputado por três mulheres. A vencedora é Julie Doucet
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Momento histórico: Grand Prix do Festival Angoulême de Quadrinhos foi disputado por três mulheres. A vencedora é Julie Doucet
É antiga a cobrança para que os grandes e mais conceituados prêmios de quadrinhos ao redor do mundo incluam mulheres em suas indicações e premiações. Afinal, o cenário das histórias em quadrinhos não é nada novo, tampouco surpreendente: uma produção masculina exaltada e a criatividade mais diversa, como sempre, deixada de segundo plano e taxada de “inexistente”. Felizmente, esse cenário vem mudando.
O estadunidense Prêmio Will Eisner, considerado o Oscar dos quadrinhos, premiou cada vez mais mulheres nos últimos anos. E, em neste ano, o francês Festival Angoulême de Quadrinhos apresentou um momento histórico em sua 49ª edição: indicou três mulheres ao pódio do maior prêmio do evento, o Grand Prix.
A premiação, que ocorreu nesta última quarta-feira (16/03), consagrou a canadense Julie Doucet como a grande vencedora da noite, indicada ao lado da parisiense Pénélope Bagieu, publicada no Brasil pela editora Nemo, e Catherine Meurisse, ainda sem publicação brasileira.
A atual vencedora do Grand Prix nasceu em 1965, em Montreal (Canadá), e se consagrou como uma das mais importantes quadrinistas da nossa era, sobretudo por apresentar um estilo underground um tanto quanto revolucionário à época. Seu trabalho fantástico — e agora premiado — nas histórias em quadrinho começou em um fanzine fotocopiado, chamado Dirty Plotte (Plotagem suja, em tradução livre), lançado em 1991. O quadrinho, que se tornou uma revista, conta parte de seu dia a dia na época da universidade, bem como suas ansiedades e desafios.
Julie iniciou seus estudos em Cégep du Vieux Montréal, em sua cidade natal, e em 1980, ela ingressou na Université du Québec à Montréal (UQAM) para o curso de artes visuais impressas. Foi com os quadrinhos autobiográficos, em especial pela forte presença na cultura underground de Dirty Plotte, entretanto, que a quadrinista ganhou sucesso e evoluiu sua carreira até chegar à etapa atual.
A parte mais interessante do trabalho de Julie, vale destacar, é sem dúvidas a imensa possibilidade de trabalhar com diferentes processos, texturas e estilos. Suas obras misturam colagens, poesias, novelas e vários estilos de desenho, o que torna tudo ainda mais autêntico e original do traço da artista.
No Brasil, as obras da artista serão em breve publicadas pela editora Veneta, que detém os direitos de publicação de My New York Diary (Meu diário de Nova York, em português), um conjunto de experiências que Julie vivenciou durante sua estadia na metrópole norte-americana. A editora garantiu que o quadrinho estará disponível ainda este ano.
Ainda que a artista não tenha conquistado o pódio do Grand Prix em 2022, é indiscutível notar como seu trabalho é extremamente impactante dentro das histórias nos quadrinhos, já premiado em 2019.
Pénélope é autora do renomado Uma Morte Horrível, publicado no Brasil pela editora Nemo, em 2016. A história está focada em Zoé, uma jovem que trabalha demais e convive com um namorado um tanto quanto folgado e, de quebra, desempregado. Ao longo da trama, repleta de plot twists e uma narrativa envolvente, ela se envolve com um escritor bem-sucedido imerso em um bloqueio criativo e, sem querer, acaba se envolvendo no maior escândalo literário do século.
Pénélope também assina a série Ousadas: Mulheres que só fazem o que querem, que conta quinze relatos de mulheres que revolucionaram a história e passaram por cima de pressões sociais e preconceitos em suas trajetórias. A obra foi agraciada, em 2019, com o Prêmio Eisner na categoria de Melhor Obra Estrangeira Publicada nos Estados Unidos e se transformou em uma série animada francesa de TV.
A autora nasceu em 1982, em Paris, e estudou na Arts Déco, para logo depois prosseguir seus estudos na Central Saint Martins, em Londres. Hoje, consagra-se entre as mais famosas e bem-sucedidas artistas de quadrinhos em todo o mundo.
É comum ver o jornalismo e as histórias em quadrinho muito conectadas, mas poucas são as mulheres da área que obtém sucesso com suas obras. E uma delas é Catherine Meurisse, repórter, ilustradora e quadrinista nascida em 1980, em Paris. É ela a artista que trabalhou como cartunista para diversos veículos famosos — Le Monde, Liberation, Les Echos —, entre eles e em especial, para Charlie Hebdo.
Autora de Le Pont des Arts (A Ponte das Artes), Moderne Olypia (Olímpia Moderna) e Drôles de Femmes (Mulheres Engraçadas), Catherine ganhou uma imensa repercussão com seu trabalho após lançar Le Légèreté (A Leveza), obra que conta seu processo de readaptação após sobreviver ao ataque que ocorreu em Charlie Hebdo, em janeiro de 2015.
Com muito espaço para uma trajetória de ocupações em espaços tradicionalmente masculinos, Catherine carrega consigo uma importantíssima carreira nos quadrinhos. Foi autora de uma adaptação da história de Alexandre Dumas, amigo do pintor Eugène Delacroix, e se tornou a primeira mulher quadrinista a ocupar a cadeira como membro da Académie des Beaux-Arts.
Luiza Vilela é jornalista formada pela PUC-SP e repórter de tecnologia, negócios e finanças. Tem afinidade com entretenimento e após foi criadora de Phantom Ladies, projeto de TCC sobre a atuação das mulheres nos quadrinhos.
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