Cinco HQs para viajar
Dicas de quadrinhos para conhecer lugares sem que precisar sair de casa
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Dicas de quadrinhos para conhecer lugares sem que precisar sair de casa
Quadrinhos, assim como filmes e livros, podem nos transportar a lugares sem que precisemos sair de casa.
Crescemos cercados de histórias sobre grandes aventuras e viagens exploratórias cheias de descobertas. Muitas delas são clássicos da literatura, escritas por homens em uma época em que as mulheres eram destinadas ao mundo interior, privado e doméstico, às relações familiares e aos eventos sociais.
Não é de se espantar que mesmo hoje, diante da possibilidade de explorar diversos lugares, muitas autoras acabem realizando viagens internas em busca de autoconhecimento enquanto se deslocam para fora de suas casas.
As HQs abaixo têm isso em comum: embora proporcionem imagens de lugares diversos, trazem em seu cerne questões pessoais que são trabalhadas durante os trajetos, enquanto estão distantes de suas cidades de origem.
Em Táxi, de Aimée de Jongh (Conrad, 2019), acompanhamos a própria autora em viagens de táxi em 4 cidades diferentes. Filha de pai indonésio e mãe holandesa, Aimée cresceu na Holanda e teve a oportunidade de visitar a Indonésia bem depois da morte de seu pai. Essas viagens acontecem em Los Angeles (EUA), Paris (França), Jacarta (Indonésia) e Washington (EUA). O que chama a atenção em seus trajetos não são as paisagens, já que todos os diálogos se passam praticamente dentro dos táxis, mas as conversas com os motoristas.
Em cada trecho nós descobrimos um pouco sobre Aimée, sobre sua relação com os pais ao mesmo tempo que conhecemos os taxistas, pessoas que muitas vezes são personagens invisíveis em nossas histórias. Essas trocas que ocorrem no trânsito também nos contam um pouco sobre as cidades e sua relação com seus habitantes. Acima de tudo, a HQ humaniza esses homens ao trazer para o primeiro plano realidades diversas, suas expectativas e suas angústias.
Imagina você se programar durante meses para sua viagem dos sonhos, pensando em todos os amigos que irá reencontrar e nas aventuras que irá viver, mas quando finalmente embarca, se dá conta que aquele sonho virou um pesadelo.
Isso foi o que aconteceu com a quadrinista e ilustradora Fernanda Montoni, que aproveitou o Inktober para contar tudo que deu errado em sua viagem à Europa.
As tirinhas podem ser acompanhadas na página do instagram da artista e capta a vibe exata da frase “você ainda vai rir disso”. Claro que todo perrengue que ela passou não deveria ser motivo de piada, mas Fernanda preferiu tirar algo de bom de tudo isso, nos presenteando com uma história cheia de reviravoltas e tensão.
Se há uma lição a ser aprendida, é que não importa o quanto você se programe, é sempre bom ter um plano B na manga.
As primas Jillian e Mariko Tamaki entregam uma HQ sensível e belíssima com clima de férias e primeiras vezes em Aquele Verão (Ed. Mino, 2019). A história gira em torno da relação entre Rose e Windy, duas amigas de infância que só se encontram no verão, quando suas famílias tradicionalmente viajam para Awago Beach.
No entanto, o que deveria ser uma reprise de épocas anteriores, quando todos os problemas são deixados para trás e tudo que você precisa é curtir a praia e os amigos, se torna um momento de encarar que a infância está chegando ao fim e que talvez, todas as coisas que nos cercavam de sensações de familiaridade e acolhimento não sejam permanentes.
Além das brigas constantes entre os pais de Rose, ela e Windy se deparam com o fato de que ambas já não possuem tantas coisas em comum, pois o início da adolescência naturalmente traz mudanças em relação aos nossos gostos, ideais, personalidade. Assim, além da tensão que se cria entre as duas amigas, há uma série de outros eventos mais dramáticos que acometem um outro grupo de adolescentes mais velhos que suscita bons debates sobre sexualidade, gravidez na adolescência, entre outros temas que marcam a passagem da infância para a uma nova fase da vida das protagonistas.
Com traço delicado e uma paleta em tons de azul, as autoras conferem leveza a uma narrativa que aborda temas não tão leves.
Power Paola é uma das quadrinistas mais frequentes em trabalhos acadêmicos e pesquisas sobre artistas latino-americanas. De origem equatoriana, tem seu trabalho reconhecido em diversos países e a HQ Virus Tropical foi publicada aqui em 2015 pela ed. Nemo (grupo Autêntica).
O traço da Power Paola é bem característico e cartunesco e em Virus Tropical somos levados a uma viagem por várias cidades da Colômbia até o Equador, sempre em meio a retratos sociais desses lugares que, em vários níveis, se assemelham a lugares que conhecemos no Brasil.
A família bem disfuncional pode lembrar uma caricatura cheia de estereótipos: pai é ex-seminarista que realiza missas clandestinas, a mãe lê o futuro em peças de dominó e Paola e sua irmã vivem brigando porque são muito diferentes, porém, se pensarmos nas famílias brasileiras e toda passionalidade tão tipicamente latina, também reconheceremos algumas pessoas nesse retrato.
Ao longo da viagem a autora consegue abordar temas como conflitos sociais decorrentes de períodos ditatoriais e sua busca por identidade em meio à sua família que por vezes parece sufocante. O bônus vem com letras de músicas que acompanham os quadrinhos e que funcionam como trilha sonora para as cenas.
Estreia da brasileira Jessica Groke nos quadrinhos, Me leve quando sair segue premissa parecida das outras HQs mencionadas aqui: a viagem serve de ponto de partida para reflexões sobre as relações das autoras ou personagens com suas famílias e como uma forma de promover autoconhecimento.
Para Jessica, sua viagem para Paraty com o irmão, foi esse momento de trabalhar sentimentos, medos e outras preocupações em meio a um cenário incrível no litoral do Rio de Janeiro.
Lançada de maneira independente em 2018, Me leve quando sair acompanha os dois irmãos enquanto relembram a infância, refletem sobre sua família e os diálogos, representados de maneira muito íntima, nos aproximam dos personagens como se nós mesmos estivéssemos com eles no carro, por exemplo. A sensação que temos é de acompanhar um álbum de família que é compartilhado apenas com as pessoas mais chegadas, pois o tom utilizado é de fato muito pessoal, quase confessional.
E aí? Curtiu as dicas? Já está pensando em sua próxima viagem? Conta pra gente nos comentários de nossas redes sociais e boa viagem!
Daniela Marino é pesquisadora de quadrinhos e questões de gênero, graduada em letras, mestre em comunicação e doutoranda em ciência da informação.
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Dani Marino é especialista em histórias em quadrinhos e questões de gênero. Mestre em Comunicação e doutoranda em Ciência da Informação pela ECA/USP, também atua como professora de Literatura Inglesa. Ganhadora de 2 troféus HQMIX com o livro Mulheres e Quadrinhos, que organizou com Laluña Machado, já colaborou com diversos sites e canais especializados em cultura pop.