Estamos cansadas
Um desabafo sobre o machismo (e as atitudes machistas) no meio dos quadrinhos
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Um desabafo sobre o machismo (e as atitudes machistas) no meio dos quadrinhos
Dia desses, dei uma aula sobre Feminismos e Gênero. Qual não foi a surpresa, quando dos seis alunos homens matriculados, apenas dois apareceram. Me lembrei dos cursos sobre mulheres e quadrinhos que já ministrei por aí, onde a presença masculina, quando não nula, foi bem próxima disso. Em um deles, um ouvinte homem se levantou e deixou a sala quando escutou a palavra feminismo sair de minha boca. Até hoje não sei o que ele pensou quando viu o título do curso, que trazia “resistência das mulheres” em meio a tantas outras coisas.
Enfim, o ano é 2022 e seguimos vendo editoras renomadas no país publicando homens e mais homens. Inclusive, se falta algum, eles importam. Enquanto isso, mulheres quadrinistas, ou que escrevem/leem HQ’s, se veem obrigadas a ‘bater na mesma tecla’ e chamar atenção para a total falta de interesse do mercado brasileiro de quadrinhos com o trabalho de nossas artistas. Dizem que mulheres escrevem quadrinhos apenas para outras mulheres. “Não são temas universais”, repetem como um disco arranhado. Mas só convidam as artistas para eventos, quando é para falar das máximas “Mulheres e HQ’s”. Mesmo assim, não comparecem para escutar o que elas têm a dizer. Fazem coletâneas, mas não se preocupam em buscar informações tampouco os trabalhos de nossas artistas, o que fica visível no espaço reservado a elas, quando aparecem.
“Mulheres quadrinistas, ou que escrevem/leem HQ’s, se veem obrigadas a ‘bater na mesma tecla’ e chamar atenção para a total falta de interesse do mercado brasileiro de quadrinhos com o trabalho de nossas artistas.”
Aí, dizem que elas não são publicadas pois não possuem “produção de peso” e que já deu, pois estão cansados de ouvir a mesma coisa toda hora, é cansativo e chato, vociferam. Me pergunto se eles acham que acordamos programadas para dizer o óbvio. Acreditam mesmo que não achamos chato ficar repetindo a mesma coisa? Não percebem que estamos cansadas? Queremos falar sobre outra coisa, virar a página, mas o cenário e o descaso com nossas artistas persistem. Então continuamos nos repetindo, ainda que exaustas.
Quando vocês não comparecem a palestras de grandes artistas, ignoram a existência e produção delas ainda que tenham contribuído ativamente com algum conteúdo, ou quando um renomado pesquisador de HQ’s interrompe nossa fala para nos “corrigir” porque acredita que iremos trazer uma informação errada (spoiler, não iríamos) sem esperar a conclusão do raciocínio, só deixam claro para todas nós que essa luta não está nem perto de acabar. E, cansadas, seguimos.
Os quadrinhos que ilustram este artigo são de Cris Camargo, publicitária, editora, produtora de conteúdo digital e quadrinista de São Paulo. É autora da série de ficção científica O Último Maranishi e da coletânea de tirinhas Ser Artista Mulher é…
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Nara Bretas é pesquisadora de quadrinhos no digital desde 2012. Atualmente, é Doutoranda em Estudos de Linguagem (PosLing) pelo Centro Federal de Educação Tenológica de Minas Gerais (CEFET/MG), onde trabalha com as temáticas: Mulheres e Quadrinhos no Brasil, Narrativas de Vida, Análise do Discurso e Feminismos. Jornalista, Licenciada em Letras e admiradora das HQs desde muito nova, Nara ama quadrinhos cotidianos e surtadas ocasionais.
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